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Burocratização: o que era para ser desburocratizado e flexibilizado

Não existe saúde e nem vida, sem uma economia girando. Muito menos quando se instaura uma crise comunitária pelo desemprego, em que pessoas morrerão de fome.

No Brasil, as pequenas e médias empresas geram mais de 80% (oitenta por cento) dos empregos formais. Em outras palavras, isso significa que, ao ficarem meses dentro de suas casas, em razão da quarentena decorrente do COVID-19, os trabalhadores deixarão de produzir, e, consequentemente as empresas para as quais trabalham, correm o risco de fecharem suas portas. O desemprego acarreta fome, miséria, violência, insegurança.

Burocracia brasileira: porque não desburocratizado e tornar flexível

Visando evitar a “crise comunitária pelo desemprego”, na noite do dia 01 de abril de 2020, foi publicada a Medida Provisória nº. 936, que, dentre outras coisas, traz a possibilidade de redução de salário e de jornada, além da suspensão do contrato de trabalho com a contrapartida do Governo Federal, denominado de “Benefício Emergencial Mensal ao Trabalhador Intermitente”.

Se de um lado essa MP estava sendo tão esperada pelos empregadores, e aqui eu ouso a dizer, que até por parte de alguns empregados, pois são conscientes de que dependem desse tipo de medida mitigadora para que seu posto de trabalho seja resguardado. Por outro lado, decisões como essa sofreram fortes retaliações por parte dos Sindicatos dos Trabalhadores e de alguns profissionais do direito, tendo inclusive sido alvo de ação direta de inconstitucionalidade, como adiante será demonstrado.

Isto porque, a MP 936/2020 dispõe aquilo que pode ser feito por acordos individuais e aquilo que obrigatoriamente deve ser feito por acordos coletivos. O art. 12 da citada MP prevê que os acordos individuais poderão ser realizados com empregados que tem salário igual ou superior a três salários mínimos, correspondentes a R$ 3.135,00 (três mil, cento e trinta e cinco reais), ou que recebam mais de dois tetos do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), isto é, acima de R$ 12.202,12 (doze mil, duzentos e dois reais e doze centavos) e que tenham curso superior. Válido dizer, ainda, que nestes casos, a proposta deverá ser encaminhada por escrito ao empregado com antecedência mínima de 2 (dois) dias corridos.

No que toca ao percentual de redução de salário e de jornada, dentro das faixas acima descriminadas, são permitidos os seguintes percentuais: de 25% (vinte e cinco por cento), 50% (cinquenta por cento) e 70 % (setenta por cento). Já para os casos em que os salários dos empregados não estão dentro das duas faixas já expostas, havendo o interesse por parte do empregador de que o contrato seja alterado, se torna indispensável o acordo coletivo.

O que está disposto na Constituição Federal?

A Constituição Federal dispõe que a redução de salário depende de acordo coletivo, e, diante de tal desiderato, foi proposta no dia 02 de abril de 2020, pelo Partido Rede Sustentabilidade, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade com pedido de medida cautelar, de nº. ADI 6363 MC / DF, cujo relator é o Exmo. Ricardo Lewandowski.

Basicamente, o Partido Rede Sustentabilidade alega que a MP 936/2020 viola os artigos 7º, VI, XIII e XXVI, e 8º, III e VI, da Constituição, razão pela qual pleiteia, desde logo, a concessão de medida cautelar, para que sejam suspensos.

“a fim de afastar o uso de acordo individual para dispor sobre as medidas de redução de salário e suspensão de contrato de trabalho, o § 4º do art. 11; e o art. 12, na íntegra; bem como das expressões ‘individual escrito entre empregador e empregado’ do inciso II do art. 7º; ‘individual do inciso II do parágrafo único do art. 7º; ‘individual escrito entre empregador e empregado’ do § 1º do art. 8º; ‘individual” do inciso II do § 3º do art. 8º; e ‘no acordo individual pactuado ou” do inciso I do § 1º do art. 9º”. Ao final, o Requerente Partido Rede Sustentabilidade pugna o julgamento pela procedência desta ADI, para declarar a inconstitucionalidade, a fim de afastar o uso de acordo individual para dispor as medidas de redução de salário e suspensão de contrato de trabalho, com a confirmação da medida cautelar requerida.

O Exmo. Ricardo Lewandowski deferiu em parte a medida cautelar, nos seguintes termos:

“Isso posto, com fundamento nas razões acima expendidas, defiro em parte a cautelar, ad referendum do Plenário do Supremo Tribunal Federal, para dar interpretação conforme à Constituição ao § 4º do art. 11 da Medida Provisória 936/2020, de maneira a assentar que “[os] acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária de contrato de trabalho […] deverão ser comunicados pelos empregadores ao respectivo sindicato laboral, no prazo de até dez dias corridos, contado da data de sua celebração”, para que este, querendo, deflagre a negociação coletiva, importando sua inércia em anuência com o acordado pelas partes”.

Agora, nos resta aguardar as informações a serem prestadas pela Presidência da República, assim como a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República para vermos as cenas dos próximos capítulos dessa ADI.

Como as empresas podem agir?

Até lá, no que toca às matérias tratadas na ADI, a empresa poderá celebrar os acordos individuais para a suspensão temporária ou redução proporcional de jornada, desde que no prazo de 10 (dez) dias, comunique o Sindicato Laboral. Por sua vez, o Sindicato terá o prazo de 8 (oito) dias para intervir na negociação, conforme o disposto no artigo 617 da CLT. Caso não haja manifestação expressa dentro dos 8 (oito) dias previstos, o acordo individual estará validado de forma tácita.

Pontos Importantes a serem considerados

Diante da ADI e das calorosas discussões trazidas por parte de alguns Sindicatos dos Trabalhadores e profissionais do direito, torna-se indispensável chamarmos a atenção de você, leitor, para os seguintes pontos. Embora a Constituição Federal preveja que a redução de salário somente possa ser feita por acordo coletivo, é de suma importância termos em mente que, claramente estamos vivendo um ESTADO DE EXCEÇÃO, vez que a necessidade de enfrentar a pandemia, implica a suspensão da ordem jurídica.

Neste sentido, a meu ver, a regra deverá ser flexibilizada pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento designado para o dia 24 de abril de 2020.  Mesmo porque, há mais de 7.000 (sete mil) acordos já registrados, segundo o site do Ministério da Economia.

Se o que pretendem o Partido Rede Sustentabilidade, Sindicatos diversos e profissionais do direito é resguardar os direitos dos trabalhadores insculpidos em nossa Carta Magna, posso dizer, com veemência, que o que também pretendem os empregadores e os pacotes emergenciais do Governo Federal é isso.

Ocorre que, de nada vale direitos garantidos pela Constituição Federal se não tivermos titulares para exercê-los em seus postos de trabalho, e, para isso, essas medidas mitigadoras e a flexibilidade das regras tornam-se imprescindíveis. Não é de hoje, que os Sindicatos têm atitudes como essa. Não se trata de PATRÃO X EMPREGADO. Temos que seguir juntos nessa luta contra o COVID-19 e, principalmente contra a crise comunitária pelo desemprego que vem se instaurando, pouco a pouco, como apresentando em outro artigo.

Portanto, Sindicatos, é hora de avaliarem com mais amplitude os efeitos colaterais, pois esse discurso de patrão x empregado não faz mais parte de um mundo globalizado, digital e ágil como o nosso. É preciso que os Sindicatos estejam próximos das organizações para que JUNTOS, seja possível alinhar as melhores decisões para ambas as partes.

Como dizia Gregório de Matos “O todo sem a parte não é todo / A parte sem o todo não é parte / Mas se a parte o faz todo, sendo parte, / Não se diga, que é parte, sendo todo”.

Deivison Pedroza – CEO do Grupo Verde Ghaia

Julia Belisário – Gestão de Risco e Compliance

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